sábado, 23 de junho de 2012

Miastenia gravis e suas repercussões oftalmológicas

A miastenia gravis é uma doença neuromuscular com incidência de 1/10.000 indivíduos que causa fraqueza e fadiga dos músculos voluntários. A doença pode manifestar-se em qualquer idade, mas acomete mais as mulheres do que os homens, entre 20 e 35 anos. Depois dos 60 anos, essa relação se inverte.
Na miastenia gravis, o sistema imune produz anticorpos que atacam os receptores localizados no lado muscular da junção neuromuscular. Os receptores lesados são aqueles que recebem o sinal nervoso através da ação da acetilcolina, uma substância química que transmite o impulso nervoso através da junção (um neurotransmissor). Desconhece-se o que desencadeia o ataque do organismo contra seus próprios receptores de acetilcolina, mas a predisposição genética desempenha um papel essencial. Os anticorpos circulam no sangue e as mães com miastenia grave podem passá-los ao feto através da placenta. Essa transferência de anticorpos produz a miastenia neonatal, na qual o recém-nascido apresenta fraqueza muscular, que desaparece alguns dias ou algumas semanas após o nascimento.
Os principais sintomas da doença são: cansaço; fraqueza muscular; dificuldade para mastigar e engolir; falta de ar; voz anasalada; pálpebras caídas e visão dupla.

Paciente com estrabismo agudo causado pela Miastenia

O primeiro profissional, a ser consultado na maioria dos casos é o oftalmologista, pois 70 a 80% dos pacientes com miastenia tem como sintomas iniciais as manifestações oculares. Nesse ponto é importante a caractrização da doença, pois muitos pacientes permanecem apenas com sintomas oftalmológicos (miastenia ocular) e 50% desenvolvem a forma sistêmica em até 2 anos do início do quadro.
A Miastenia gravis na forma ocular é a forma da miastenia que afeta apenas os músculos da região dos olhos, não ocorrendo evolução para a forma generalizada. Os sinais mais comuns são a queda da pálpebra superior (blefaroptose) e a diplopia (visão dupla) decorrente da alteração nos músculos extra-oculares, causando os mais variados quadros de estrabismo.

No diagnóstico da miastenia, o principal substrato é a suspeita clínica. O quadro principal é de fraqueza e fatigabilidade muscular. A fraqueza aumenta durante o exercício repetitivo e pode melhorar depois de período de repouso ou de sono (aspecto flutuante). A dificuldade à deglutição pode ocorrer em decorrência da fraqueza do palato, da língua ou da faringe, dando origem à regurgitação nasal ou aspiração de líquidos ou de alimentos. O déficit motor em membros é muitas vezes proximal e pode ser assimétrico, com preservação dos reflexos tendíneos profundos.

A eletroneuromiografia, é um exame em que a estimulação nervosa repetitiva geralmente assegura a possibilidade diagnóstica. Nos pacientes miastênicos há uma redução rápida (decremento) de amplitude das respostas evocadas de mais de 10 a 15% em relação aos estímulos elétricos repetidos.

Particularmente gosto muito dos testes farmacológicos, em que através da aplicação endovenosa de prostigmine, avaliamos a recuperação da força muscular de maneira objetiva e rápida.
Através de exames de sangue pode-se tentar fazer o diagnóstico. Os testes imunológicos (anticorpos anti-receptor de acetilcolina) são detectados no soro de aproximadamente 50% dos pacientes miastênicos. Não há relação entre o nível sérico de anticorpos e a gravidade da doença.

É obrigatória a realização da tomografia de tórax, pois  75% dos pacientes miastênicos apresentam anormalidades no tecido tímico, sendo a mais comum a hiperplasia folicular linfóide. Porém, 10 a 20% dos pacientes miastênicos apresentam associação com timomas, sendo por isso realizada de forma rotineira a investigação de tumores mediastinais nestes pacientes.
Paciente com miastenia ocular após corticoterapia
Ainda não existe cura para a miastenia gravis, mas existem medicamentos que favorecem a permanência da acetilcolina na junção neuromuscular e outros que reduzem a produção de anticorpos contra os receptores da acetilcolina. Os cortiscosteroides e os imunossupressores (em geral a azatioprina) são também recursos farmacológicos utilizados no tratamento dessa moléstia, sendo medicações comumente indicadas na forma ocular.
A plasmaferese (troca de plasma) e o uso de imunoglobulinas tem-se mostrado útil em alguns casos, mas apresenta o inconveniente de produzir efeitos de curta duração. Os resultados da retirada do timo são discutíveis.